Entrevista com Caio Rossan

24/01/2022

Cabra da peste. Nordestíssimo. Arretado até o último fio de cabelo, e onde não tem, também. Dono de um sotaque gostoso, bom de lábia, com uma personalidade incrível, talentoso, biscoiteiro nas horas vagas e grande promessa do ano na Editora Rocket. Ele é Caio Rossan. (Não fosse pela Rocket, parece até uma bio do Tinder).

Tenho o imenso prazer de trazer esse autor maravilhoso para uma conversa gostosa e reveladora em nosso espaço de entrevistas. Leia até o final e você não há de arrepender-se, hahaha.

CAIO ROSSAN POR CAIO ROSSAN.

Nada veio fácil pra esse cabra de coração gigante, que cresceu em meio a simplicidade e que sempre teve uma força estranha que o impulsionou a não-desistência. Responder esse questionamento de RH não é fácil, mas hoje o Caio Rossan gosta do que vê no espelho, sente orgulho de sua trajetória e não abaixa a cabeça para quem não calça suas sandálias. A percepção aguçada, o humor ácido, o silêncio, a cautela, o corte cirúrgico e sangue nordestino que acolhe e que também ferve, são características fortes.


COMO O MEIO INFLUENCIA NA SUA ESCRITA?

Às vezes eu me sinto a Adele: quando mais eu sofro, mais gosto do que eu escrevo. Ou seja, o desafio e as dificuldades me conduziram à produtividade. Aí alguém lê isso e diz: "ainnn o Caio Rossan está romantizando o sofrimento". Então ser humano seboso, eu respondi uma pergunta que diz respeito a um detalhe do meio que influencia minha escrita. Se você quer que eu minta, continue sendo um pau no cu.


SER AUTOR NUM PAÍS GOVERNADO PELO "DESGOVERNO" CULTURAL É?

Viver pela força do ódio e sofrer de gastrite nervosa.


COMO É SEU PROCESSO CRIATIVO?

Primeiro eu preciso de tempo. Depois, de organização prévia. Crio personagens através de mapas astrais, construo rocamboles e brinco com as relações entre eles. Gosto do estereótipo e mais ainda de quebrá-lo. As escaletas são minhas amigas: não consigo iniciar um conto/novela/romance sem definir pontos de virada e o final. Sem nada engessado; tudo pode mudar no decorrer do processo, que inclusive, requer uma boa trilha sonora, temperatura baixa, muita água e quase zero luminosidade.


VOCÊ É MÉDICO. O RELACIONAMENTO COM PESSOAS TÃO DIVERSAS AJUDA NA CONSTRUÇÃO DE PERSONAGENS?

O ser médico apenas aumentou o contato com personas diferentes. Mas desde minha adolescência eu tinha um defeito: me sentava estrategicamente em bancos de jardim para observar como as outras pessoas caminhavam, seus gestos, falas. Em Cafés, escondido em óculos escuros e fingindo tomar um capuccino por horas, observava discussões entre casais, flertes e conversas ao celular. Tudo pelo bem da escrita, claro.


FALE UM POUCO SOBRE "MARCADOS".

Marcados é o fruto de uma batida no liquidificador que inclui uma mistura entre os roteiros dos filmes slasher da década de 90 e o suspense da série Vagalume e dos Karas. Um pouco de Pânico e Lenda Urbana, com inspiração em Marcos Rey, Lúcia Machado de Almeida e Pedro Bandeira. Dito isso, acrescentei meu toque pessoal: quebra de linearidade temporal, brasilidade, representatividade, destruição do maniqueísmo, tretas e sangue, muito sangue. Estou ansioso para que vocês conheçam a Calila (protagonista do Marcados)!


COMO É SER AUTOR DA ROCKET?

É como ter um tapete vermelho estendido para você o tempo todo. Cláudia é segura, respeitosa, assertiva, sabe o que faz e para onde vai. Trata os autores como as demais editoras deveriam trata-los. É isso.


QUAL A EXPECTATIVA PARA O CATARSE?

Desde o primeiro momento que soube que iríamos tentar o financiamento coletivo primeiro, eu tremi na base. Continuo tremendo. Tenho muito receio de decepcionar, de não alcançar a expectativa, de não bater metas. Mas vamos com medo mesmo.


COMO A PRESSÃO PELA PRESENÇA NAS REDES SOCIAIS E NÚMEROS EM ENGAJAMENTO TE AFETA?

Hoje bem menos que antes. Eu entendo a importância que as editoras dão para os seguidores, mas não aceito ser refém de ninguém. Não sou apenas um escritor, tampouco só um médico; sou o Caio escritor, médico, filho, pai de pets, que luta para perder peso, que faz resenhas literárias, que é cinéfilo, antifascista, antibolsonaro, que indica colegas autores, que faz um mestrado almejado e que quando quiser vai postar foto de sunga sim (o zoom é por conta de vocês). Ou seja, não há um pedaço de mim no meu perfil do Instagram. Estou todo ali. Quem não gostar, dê unfollow e pronto.


VOCÊ É UMA DAS PROMESSAS DE UMA EDITORA QUE SÓ LANÇA SUCESSO. COMO LIDAR COM ISSO?

Marlos, eu já me pressiono o bastante e você ainda coloca essa pressão. Eu farei de tudo para não decepcionar a Rocket, a Cláudia, os Igs literários que me apoiam, meus colegas autores e amigos leitores. Até lá, dá-lhe insônia e gastrite.


SE PUDESSE VIVER A VIDA DE UM PERSONAGEM FAMOSO, QUAL SERIA?

Dom Quixote. Sério. Prefiro mil vezes batalhar contra moinhos de vento.


VOCÊ É DAQUELES QUE SONHAM EM VER SUA OBRA ADAPTADA PARA CINEMA, TEATRO, TEVÊ?

Se sou um daqueles? SIM!! Ver a Calila com seu "casco" nas costas, subindo na boleia de um caminhão em direção à Alto Cedro seria incrível! Tão incrível como vê-la amedrontada diante do seu principal algoz: O Carranca.


DEIXE UMA MENSAGEM PARA SEUS LEITORES.

Meu ritmo de produção é lento, em partes porque me cobro bastante (coisa de virginiano). Então, é possível que eu não lance muitas obras em curto período de tempo. Só peço para não desistirem de mim; aceito feedbacks, me comprometo a causar-lhes boas surpresas com plot twist e façam anotações enquanto leem algo meu; a intenção é que vocês sejam os detetives.


UM POUCO MAIS SOBRE CAIO ROSSAN.

Olha, não vou mentir para vocês: meu sonho de criança era sair por aí, escrevendo suspenses ou sci-fi, com uma mochila nas costas, duas ou três cuecas no compartimento menor, algumas regatas e shorts de linho. Capturaria Pokémons até encontrar uma sociedade alternativa para chamar de minha. Como falei, foi apenas um sonho. A realidade capitalista e os sonhos dos meus genitores me levaram a estudar até o enfado, por quase todas as gerações dos Buendía, para finalmente ingressar no curso de Medicina numa universidade pública.

Antes de ter pelos pubianos, minha mãe já havia me obrigado a ler clássicos como O Alienista, Escrava Isaura, O Cortiço, Moreninha e claro, Dom Casmurro e aquela pergunta mais chata que a do tio do pavê. Resultado: só voltei a lê-los mais tarde porque foi importante para o ENEM. Mas lê-los com dez anos? Zero prazer. Foi aí que, numa das três estantes de livros da singela biblioteca de Jucuruçu, cidade baiana onde cresci, me deparei com a série vagalume. A paixão foi instantânea pelos mistérios bem elaborados e abrasileirados de Marcos Rey e Lúcia Machado de Almeida (e seu inesquecível Escaravelho do Diabo). Pedro Bandeira veio logo depois, afinal, a adolescência foi chegando e a Droga da Obediência gritava por mim.

Dos onze aos quinze, escrevi Marcados. Já naquela época, me questionava porque era tão raro ler livros com protagonistas não-brancos, motivo do qual não me via representado nas histórias. Desta forma, criei a Calila, minha primeira protagonista e que também pode ser meu álter ego, sei lá. E falando em mim, sou o Caio Rodrigues dos Santos, mas prefiro ser tratado pelo meu pseudônimo: Caio Rossan. Sou escancaradamente contra hegemônico, levemente agridoce e orgulhosamente nordestino. Sou empático e resiliente. Prático e decidido. Gosto de aprender e de ensinar o pouco que sei. Não há uma gota de sangue de barata em minhas veias. Curto filmes e séries da Marvel, sou apaixonado por Maria Bethânia, pelo rock nacional e internacional. Apaixonado por açaí, cuscuz e tapioca, tenho vários felinos em casa e sou virginiano com ascendente em escorpião; lua e vênus em câncer, pra dar uma equilibrada e deixar meu coração meio idiota.

Inclusive, por hora estou solteiro, me considero cinco na escala de Kinsey, sou sapiossexual e demissexual. 

Se você leu até aqui, saiba que muitos autores estão por aí, com histórias de vida e livros incríveis, batendo de porta em porta e fazendo-se ser visto até que uma editora acredite neles. A Rocket acreditou em mim, através do meu primeiro thriller: "Marcados". Lançado na Amazon de forma independente em setembro de 2020, ele obteve críticas positivas tanto no Skoob quanto na própria Amazon. Participo da antologia "Nada é o que Parece" da Editora Oito e Meio (selo Transversal), da coletânea Bardos Baianos com o poema "Por onde Piso" e fui um dos 31 autores selecionados no projeto Novos Autores Baianos, financiado pela Fundação Pedro Calmon via Lei Aldir Blanc, em 2021.

Prefiro escrever em primeira pessoa, e utilizo técnicas literárias que brinquem o tempo, como analepse, prolepse, flashbacks e flashforwards. As alterações temporais são naturais e fluídas dentro de um próprio parágrafo, característica ousada, mas que define meu estilo. Também uso em pouca demasia o fluxo de consciência. A intencionalidade da minha escrita é que o leitor se sinta o investigador, atento às pistas que deixo pelo caminho. Também gosto de pontos de virada e tento, na medida do possível, transgredir os formatos já batidos e bem conceituados da jornada do herói.

Atualmente, minhas inspirações literárias são Agatha Christie e seus plot twists, Raymond Chandler e seu estilo noir, Conceição Evaristo e sua capacidade de me fazer chorar a cada trecho e Octávia Butler com suas críticas sociais.

Tenho twitter mas lá sou apenas voyeur. Tenho facebook, mas ele está bem aposentado. No instagram sou mais ativo, então segue lá, me envia direct com feedback do meu perfil e vamos conversando. Abraço fraterno, criaturas.


Marlos Quintanilha - Blog de literatura
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